quarta-feira, 17 de abril de 2013

A UTOPIA, O PRÍNCIPE E A COCANHA


As duas obras trabalhadas nesta situação de aprendizagem nos convidam a, pensar e refletir sobre os dois estudiosos renascentistas (Nicolau Maquiavel e Thomas Morus) e suas relações com o imaginário popular dentro de uma relação de “circularidade” cultural entre o erudito e o popular.
Nicolau Maquiavel, um dos principais pensadores políticos da península Itálica no século XVI, foi alto funcionário da chancelaria de Florença e designado para tratar de assuntos externos da República florentina. Sua obra principal, O Príncipe, foi publicada no final de sua vida e reflete o pragmatismo típico de um funcionário que transitou entre as esferas de poder da Europa e conheceu os jogos políticos de seu tempo. Evidencia a grande fragilidade dos Estados europeus, ainda em processo de formação, e como se colocavam os governantes e políticos diante das circunstâncias que lhes apareciam. Leia o texto a seguir:

“O príncipe, de todo modo, deverá fazer-se temido, de sorte que, em não granjeando a estima, ao menos evitará ser o alvo de ódios, afinal, é perfeitamente possível a um só tempo fazer-se temido sem fazer-se odiado, o que, aliás, ocorrerá sempre que ele se abstiver dos bens dos seus concidadãos e dos seus súditos, bem como das mulheres destes.
E, se ainda precisar atentar contra o sangue de alguém, deverá fazê-lo com uma decorosa justificação e com uma razão manifesta.
Mas, sobretudo, deverá ele abster-se dos bens de outrem, visto que os homens não tardam tanto a esquecer a morte de um pai quanto a perda de um patrimônio.”
MAQUIAVEL, Nicolau.  O Príncipe. Porto Alegre: LP&M, 2006.

Ele (Maquiavel) escreveu o livro em uma península não-unificada, com guerras e invasões estrangeiras constantes; a fragilidade de alguns governos italianos preocupava-o, se comparada com monarquias poderosas como a inglesa, a francesa e a espanhola.
A importância da obra de Maquiavel na época de sua produção deu-se principalmente, porque foi escrito durante a consolidação dos Estados Modernos europeus. Há durante todo o livro lições de como um governante deve agir para que o poder seja adquirido e mantido em suas mãos.

Paralelamente ao pragmatismo de Maquiavel, a Europa Medieval conviveu com inúmeras utopias, como o mito da Fonte da Juventude e o Reino do preste João, sendo a mais famosa delas a criada por Thomas Morus. No geral, elas constituíram as idealizações “de sociedades afortunadas, regidas por leis muito diferentes dos rígidos preceitos que ordenam a vida cotidiana. As utopias do século XVI desejaram fazer passar por concreto o que era exagerado e o que contrariava frontalmente as duras regras da vida real, refletindo um forte pessimismo em relação ao presente e uma grande esperança no futuro”.

O texto de Thomas Morus que você confere a seguir é uma utopia erudita, na qual se descreve uma ilha bastante organizada, onde os habitantes trabalham, possuem poucas leis, mas elas existem; há um regramento da alimentação, embasado na manutenção da saúde.
No caso das utopias populares, diferentemente da obra de Morus, o destaque é a Cocanha, região mitológica na qual as pessoas não trabalhavam, só havia vinho para beber, comida abundante, sexo ao bel-prazer e o melhor de tudo: nada disso tinha fim. Era uma quimera muito frequente no imaginário popular da época: “representou os anseios dos homens pobres do Renascimento, e uma recusa obstinada, por meio da imaginação, da precariedade da vida”.

“Os utopianos vivem em paz e amizade uns com os outros. Nenhum magistrado se mostra orgulhoso ou temível. Chamam-lhes pais e, de fato, agem como tal. Os cidadãos prestam-lhes as devidas homenagens, espontaneamente, sem qualquer coação.
O próprio príncipe não se distingue dos outros cidadãos por vestuário principesco, nem por coroa, diadema real ou manto, mas por um pequeno feixe de trigo que leva consigo. Espantam-se os utopianos que alguém seja tão louco que se deleite com o brilho incerto de uma pérola ou pedra preciosa, quando se pode olhar o brilho das estrelas e a luz do Sol. [...] Maravilham-se também que o ouro, por não servir para nada, seja mais estimado entre os outros povos que o próprio homem [...].”
MORUS, Thomas. Utopia. São Paulo: Martin Claret, 2004.

Ao descrever a ilha de Utopia, Morus fez duras críticas ao contexto inglês do século
XVI, sobretudo, ao poderio dos reis, da ganância gerada pela riqueza e pelo poder.
Ele escreveu a Utopia no século XVI, durante o reinado de Henrique VIII, em um contexto absolutista, no qual o poderio da monarquia inglesa atingiu seu ápice.
Morus foi executado por Henrique VIII, um dos principais admiradores de Maquiavel.

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